segunda-feira, 30 de setembro de 2013

MELHORES TRAGÉDIAS

Por esses infortúnios da vida, precisei de intervenção cirúrgica, nada tão grave, mas delicada, na boca, gengiva e dentes. Lá estava eu, Hospital Astrogildo de Azevedo, avental branco sobre o corpo, bloco cirúrgico e entre médicos e enfermeiras, o inicio de tudo com uma pequena picada de agulha dando inicio ao efeito potentíssimo da anestesia. Grandes viagens cósmicas, delírios imaginários, alucinações, mundo colorido, estrelas e luas a passar lentamente sobre minha cabeça fazendo soprar doce e morna brisa e lamber meu rosto. Pensamentos viajando até o infinito e o corpo a subir vencendo a força da gravidade a me fazer flutuar nas nuvens. Tudo a cores e em quarta dimensão. E de repente, o corpo desce, o pensamento some, as luzes desaparecem e o mais negro dos sonos a me levar para a total e completa inconsciência, lá onde o vazio é tão profundo que nada se ouve, menos se vê e desaparecem todos os movimentos, como uma parada congelante de tempo, espaço e sentidos. É tudo de nada. O maior e mais absoluto buraco negro, a analgesia, a amnésia e o bloqueio total dos movimentos. Nada existe e nada é percebido. Se assim ficássemos por décadas, nada iria mudar, pois a existência simplesmente cessa. Assim é a anestesia .O final de tudo, pelo tempo que a farmacologia determina. Somos reféns da química. Mas é uma viagem alucinógena e por essa sensação gostaria de ser operado todos os dias e viver curtindo esse "grande barato". Nem precisaria visitar a "cracolândia" e faria minhas "viagens" assistido por um competente corpo médico. E tudo correu muito bem, e no dia seguinte no colo de alguns assistentes fui levado cuidadosamente para minha casa com a orientação de repouso absoluto. Obediência cega, pois passei toda a manhã quase imóvel, nem movimentei a cabeça para lado algum. Porém isso tudo foi ficando entediante e muito cansativo. Logo após o almoço, ausência total dos genitores na casa, movimentando o corpo, levantei e andando até a janela fui verificar se o mundo lá fora queria saber de mim. E que bela visão, pois alguns amigos e irmãos estavam na casa em frente que, por estar sendo demolida, parecia cenário de guerra, coisa altamente atraente para quem o tempo todo vive em busca de aventuras. E de modo trôpego, ainda meio cambaleante, fui lentamente até a porta, sai furtivamente e me dirigi ao grupo postado junto ao muro semi demolido. Algumas perguntas sobre meu estado e a conversa se atira para outros lados. E os desafios começam a surgir, e de repente alguns já estavam a desbravar aquele mundo complexo e hipnotizante que eram os escombros a levar a túneis e labirintos. E eu sentado num canto a tudo observar. Mas paciência e controle tem limite e vencendo meus os meus próprios, fui em direção a esse mundo desconhecido a ser desnudado. No inicio, muito lentamente até que ia me saindo bem, até que ao olhar para o alto, uma pequena escadaria formada por restos de alvenaria empilhada me levaria ao mais alto posto de observação desse novo mundo. E fui. E subi. E lá cheguei. E de lá despenquei. E de lá voei diretamente sobre outra pilha de tijolos que desarrumadamente se encontravam abaixo deste posto de observações. Nem preciso dizer que a partir daí tudo escureceu e os últimos pensamentos e sensações eram de muito sangue, muita dor e muito medo. Foi gritaria geral e sem saber como novamente cheguei ao Hospital Astrogildo de Azevedo em menos de 24 horas que daí eu tinha saído. E o plantão da enfermeira que tinha se despedido de mim ainda nem tinha terminado. Ao me ver deitado, rosto ensanguentado e boca muito machucada, comentou: "Acho que conheço esse rapaz". E meus pais, não estando em casa, ainda nem sabiam do ocorrido. E a enfermeira a dizer: "Limpem ele que acho que o conheço". E bem feito, pois por tanto ter desejado nova viagem anestésica, novamente mergulhei no fantástico mundo das alucinações químicas. 
E desse hospital saí, de castigo, outra vez, com o rosto tapado de bandagens nariz fraturado, olhos inchados, algumas dezenas de pontos em volto dos supercílios e com aquela cirurgia do dia anterior também refeita. Lembro do espanto de professoras e colegas, pois com semblante tão desfigurado, demorei muito para recuperar o mesmo rosto que a algum tempo tinha me abandonado. 
E nunca mais voltei a esse querido Hospital, até o dia que eu e Asdrubal, menos conhecido por Kimura, caímos lá perto da Zona, morada frequente do Ênio, de uma moto emprestada, que furou o pneu em pleno gozo de ótima velocidade que desenvolvíamos. Mas isso é outra história.
MAS QUE COISA DE LOUCO!!!!! QUE BARBARIDADE!!!!
Jacob Chamis

2 comentários:

  1. Me lembro muito bem!
    Porque a sua ausência foi longa, e deixou uma lacuna irreparável no nosso cotidiano de travessuras, grandes viagens cósmicas, delírios imaginários, alucinações e mundo colorido, que nem a mais forte das anestesias poderia sequer imitar!
    Beijo!
    Christina Trevisan

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  2. Maria Angélica, querida Geca,
    Fiquei feliz quando, ao abrir meus e-mails, reconheci tua letra que tão bem lembro dos cadernos ou das tuas provas quando eu ficava conferindo para ver se estavas respondendo corretamente.


    Maria Helena, companheira de minhas bobagens,
    Isso que estou escrevendo estão em minhas lembrança ou imaginação, mas pertence a todos nós. O uso é do jeito que cada um se encontrar numa dessas histórias. Todos nelas estão incluídos, pois todos em todas as passagens estão muito presentes.


    Ênio, caro e caríssimo amigo,
    Sim Senhor, desculpe senhor, nunca mais farei nada errado Senhor, não sabia que iria perturbar. E sei que estas fazendo tudo isso para meu próprio bem e proteção, mas não precisava ser tão rigoroso.

    A quem interessar possa,
    Como o Ênio não deixou, a última ficará sem ser enviada, portanto concluiremos amanhã.

    30/09

    A CORNETA DA BANDA

    01/10
    SAPATO NOVO
    Jacob Chamis, mas que barbaridade!!!!!

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