A Máquina do Tempo

Último ano, sentada junto a porta dos fundos de minha aula, imaginava como seria dominar o tempo. Olhando longe através daquela porta sempre entreaberta, considerada o vão secreto de entradas e saídas, que muito serviu para retiradas estratégicas quando, a procura de algo mais interessante, conseguíamos fugir daquele ambiente que tanto nos sufocava. Muito me perguntei se não haveria algo mais digno a ser contemplado por homens em formação nos seus avançados 17 anos de vida. Dias longos, horas lentas, ideias rapidíssimas, pensamentos ligeiros. O período de aula de 50 minutos as vezes atrapalhava quem muito nada tinha a fazer. Mas ficar esperando simplesmente o tempo passar era descabido e vergonhoso para todos nós. Era cruel olhar o relógio e concluir que um minuto demorava sessenta segundos, uma hora sessenta minutos e uma manhã longas cinco horas. Mas não tínhamos como alterar esse estado de coisas. Estávamos refém de um sistema de medida de tempo que há milênios de maneira cruel aprisionava nossas vidas. Mas tudo deve ter solução. Nada é permanente. Viajar no tempo e alterar o horário de todos os acontecimentos passou a ser o objetivo daqueles futuros brilhantes cientistas que, sentados ao fundo da sala de aula, sonhavam em reinventar uma nova roda. Utilizar o aprendizado em inventos que alterassem e contribuíssem para revolucionar o universo passou a ser o objetivo. Foram longos os anos de lições ministradas pelas maravilhosas professoras do Maria Rocha e deveriam ter alguma serventia. Várias reuniões de estudos passaram a ser realizadas e boas teses acadêmicas foram desenvolvidas. No porão da casa de um colega, descobrimos, já sem utilidade, pequeno objeto que com algumas adaptações alteraria a ordem das coisas e nos levaria a viajar para o futuro, ou melhor, traria o futuro para mais próximo de nós. Pouco estudo e nada de dinheiro investido no invento. Longas noites sem dormir e vários fins de semanas longe do aconchegante convívio de nossos familiares. Mas finalmente tudo ficou pronto. O invento fora realizado. Tal engenhoca foi batizada de “Sir Monele” ou simplesmente, Sirene Monofásica Elétrica. E seu funcionamento era muito simples, pois bastava  com uma pequena extensão de fio liga-la a uma tomada e estridentemente seu som imitava a sirene que determinava o final das aulas. Era a tão esperada viagem no tempo, pois utilizada no último período, trazia o final da aula para mais próximo de nós. Ganhávamos no mínimo 15 minutos do dia. Antecipávamos a saída em no mínimo 15 minutos. Tirar tempo do tempo e não dar tempo ao tempo, era essa a nossa grande descoberta, inverter velhos ditados. E era uma maravilha, pois colocada sorrateiramente do lado de fora da sala, a semelhança com a original até que era razoável. A correria era intensa e a debandada imediata. Quando a professora ia verificar o que ocorrera, já tinha aluno em casa sentado angelicalmente aguardando o sagrado alimento que seus pais traziam a mesa para o almoço. O projeto foi batizado como “Viagem no Tempo”.

A maior frustração foi nunca ter participado de nenhuma feira de ciências para tentar uma honrosa premiação ao nosso querido Maria Rocha.

Hoje vejo que aqueles sagrados minutos muito me fazem falta, pois ao ajudar crianças em suas atividades escolares, enfrento dificuldades em resolver os problemas propostos pelas atuais professoras. Dia desses, sentado aguardando o inicio da sessão de teatro, ao toque do sinal para 5 minutos do inicio, sem pensar em nada, levantei de minha cadeira e corri alucinadamente em direção a saída. Foi engraçado, pois ao recuperar minha consciência temporal, reconheci o absurdo e retornei constrangido ao meu assento. Que espetáculo. Mas que barbaridade. Viva 20 de Setembro.