Num belo e espaçoso centro escolar, chamado Instituto Machado de Assis, existiam três salas de aulas e uma delas era no andar superior.
No térreo também havia minúsculo pátio onde se refugiavam, quando necessário, os exaustos alunos que já não aguentavam mais assistir as aulas.
E foi num dia desses, nenhuma data em especial, que um grupo seleto se reuniu para conversar sobre todo e qualquer assunto que não envolvesse estudo. Conversa vai, cochicho vem e trelas pra todo lado, tudo como sempre, na maior alegria e felicidade. Olhos atentos como ratos a observador tudo ao redor. E foi assim que descobrimos um enorme cano de plástico tipo PVC. Diâmetro pequeno mas de longo comprimento. Daí tem que sair alguma coisa. Um olha, pensa e retorna pra conversa. Outro assim o faz e também pensa. Outro e mais outro. Mas pensamentos coletivos sempre dão porcaria. Conversas sussurradas, quase cochichos para não perturbar quem está em aula. Respeitamos, pois amigos e cúmplices sempre estão por todas as aulas e sempre estão sedentos para fazer companhia. Somente não vêm quando não conseguem fugir. Quando nos olhavam da sala lá de cima, se alvoroçavam, loucos para sair. Ficavam agitados, mas como bom cabrito não berra, todos permaneciam em silêncio. De minuto em minuto, um olhar suplicante para estar junto de nós. Sabiam que faríamos algo digno, do tipo que trouxesse orgulho. É o que mais gosto nisso. Somos que nem cachorros que se agrupam só para latir sem motivo. Não se pode ver alguém coçando o saco que já da vontade de coçar junto. É uma doença contagiante. Outro olhar para o cano e a conversa continua. Um olhar diabólico chama a atenção de todos. Sem nada dizer, todos entendem o plano. E lentamente aquele comprido cano começa a ser erguido subindo em direção a janela dos fundos da sala do andar superior. Sobe lentamente e sobe sempre. E a subir, leva nossa adrenalina, dispara nossos batimentos cardíacos. Era difícil segurar o riso, pior controlar a emoção. O desfecho inimaginável, o final imprevisível, mas a encrenca, com toda a certeza, inevitável. E com maestria aquele enorme cano adentra a sala, sem ruído, sem escândalos, sem alardes. Como uma serpente a desbravar novos ambientes. Quem estava sentado próximo a janela, diz que teve febre, quase surtou mas permaneceu calado. Então , o cano é puxado de volta, saindo da sala, e novamente, volta tentando ir cada vez mais para o interior da sala. Corações acelerados, arrepios, tonturas e um silêncio quase mórbido.
Mas um ato de brincadeira inocente colocou em risco toda a jornada. Alguém com força tentou puxar nossa serpente. Estavam tentando arrancar de nossas mãos o que nos pertencia. Era um puxa e frouxa silencioso mas viril. Cabo de guerra dos brabos e tensão para os dois lados. E a guerra estava declarada. Se querem guerra terão guerra. E terão a mãe de todas as batalhas. E o alvoroço a tomar forma. E mãos firmes não mais soltavam o cano. Era luta das brabas. Algo precisa ser feito. Tínhamos que resolver aquele imbróglio. Alguém sussurrou:" dá um toque de ataque". Mensagem entendida. E alguém rapidamente, com a boca na ponta do cano, prepara o sopro mais forte que um guerreiro poderia dar. Tamanha força proporciona na outra ponta um ensurdecedor som semelhante a apito de navio que se aproxima do porto. TÔOOOOOOOO. E o susto no andar de cima foi imediato e a fuga no andar de baixo foi supersônico. Antes que a normalidade voltou a sala de aula, os corneteiros já tinham entrado de volta na sala de baixo pela porta secreta, dos fundos e compenetradamente já mostravam interesse na aula fazendo perguntas pertinentes a matéria que nem imaginava do que se tratava. Os da sala de cima apontavam agitadamente para as casas ao redor dizendo que algum tocador de tuba deveria estar ensaiando para alguma apresentação. Agitados e nervosos todos pulavam sobre suas cadeiras. A professora até água com açúcar pediu. Ainda hoje, sempre que ouço o apito grave dos navios, fico a lembrar tão maravilhoso episódio.
Jacob Chamis
Nenhum comentário:
Postar um comentário